Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]


14 de Setembro

14.09.21

(...)

Fala-se do medo. Trata-se de uma abstracção, pois está sempre no futuro ou no passado, jamais no presente. Ao surgir o sentimento denominado medo, tratar-se-á realmente de medo? Perante o perigo, de ordem física ou psicológica, é impossível fugir dele. Mas, na absoluta atenção, o medo desaparece. Ele surge da desatenção, do desejo de escapar do facto e, portanto, ele é a própria fuga.

Nos relacionamentos, o medo assume diferentes formas, tais como arrependimento, ansiedade, esperança, desespero. Está intimamente vinculado à busca de segurança, àquilo a que chamamos de amor e devoção, à ambição e bom êxito, à vida e à morte. O medo existe em todos os níveis da nossa consciência, sendo também a origem da resistência, da autodefesa e da renúncia. Medo do escuro e medo da claridade; medo de ir e medo de vir. O desejo de segurança está no princípio e no fim do medo; o desejo de segurança, física ou psicológica, o desejo de escapar à incerteza e à impermanência das coisas. Desejamos a continuidade na virtude, nas relações, na acção, na experiência, no conhecimento, em todos os níveis da existência. Todos clamam por segurança, e dessa insistente busca nasce o temor.

E existirá a estabilidade material ou psicológica? Vemos que mesmo no plano físico, vivemos na incerteza, sob constante ameaça de guerras, revoluções, da implacável marcha do progresso, acidentes e terremotos. É indiscutível a geral necessidade de abrigo, alimentação e vestuário. Apesar da desenfreada busca de segurança, conhecemos nós a segurança ou a permanência psicológica? Claro que não. E a não aceitação deste facto, a fuga deste facto, é o medo. A incapacidade de encarar esta realidade cria a esperança e o desespero.

O pensamento em si é a fonte do medo. O tempo é a sua essência e pensar no futuro suscita o prazer ou a dor; se visamos a um objectivo prazeroso, o pensamento busca alcançá-lo, temendo malograr-se; sendo
desagradável, no próprio desejo de evitá-lo está o medo. O prazer e a dor são a raiz do medo, e o pensamento e o sentimento, gerados pelo tempo, acompanham-no. A compreensão do mecanismo da memória, do pensamento e da experiência elimina o temor. O processo da consciência é o movimento do pensamento, no sentido horizontal ou vertical; ele não é apenas a coisa pensada, senão aquilo que lhe dá origem. É a crença, o dogma, a ideia, o raciocínio, e é também o centro do qual estes emanam. E esse núcleo é o nascedouro de todo o medo. Sentimos realmente medo, ou estaremos apenas conscientes da causa que produz o mecanismo de fuga do pensamento? A auto-protecção física demonstra sanidade e equilíbrio mental, mas todas as demais e conhecidas formas de defesa psicológica implicam resistência e temor. Essa reacção impede a segurança física, transformando-a numa questão de classe, prestígio e poder, originando uma brutal competição.

Libertamo-nos do medo, superficial ou profundo, ao compreendermos totalmente a estrutura do pensamento e do tempo, seus efectivos criadores. À autocompreensão é o desabrochar e findar do medo.
Cessando o medo, cessa também o poder de criar ilusões, mitos, visões, carregadas de esperança e desespero. Tem início, então, o movimento que vai além da consciência, do pensamento e sentimento. É a libertação, por parte da consciência, dos desejos e anseios íntimos. Então, nesse vazio, livre de influência, de conceitos, barreiras ou palavras, nessa imobilidade do tempo e espaço, vislumbramos o inefável.

Krishnamurti, Diário de Krishnamurti

Autoria e outros dados (tags, etc)




Arquivo

  1. 2022
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2021
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2020
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2019
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2018
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2017
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2016
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2015
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2014
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D

Mais sobre mim

foto do autor