Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]


17 de Setembro

17.09.21

(...)

A estranha energia esteve presente o dia todo; ténue, a maior parte do tempo, atingia momentos de intenso fulgor para, em seguida, reduzir a chama e prosseguir suavemente. A intensidade daquela energia imobilizara-nos, obrigando-nos a permanecer sentados. De madrugada, sentíamos a sua poderosa presença e, no silêncio do terraço, quando a cidade se aquietara, a meditação não se fizera de rogada e lá estava ela em toda a sua plenitude. O êxtase revelava a futilidade e infantilidade de tudo. Como era comum, nestas ocasiões, o corpo estava imóvel e o cérebro permanecia silencioso e sensível.

Pouco mudamos no decorrer das nossas vidas. Costumamos modificar-nos sob pressão interna ou externa, o que, na realidade, é mero ajustamento. Algum tipo de influência, uma palavra, um gesto, podem
suscitar a mudança superficial dos nossos hábitos. A propaganda, o jornal, ou um incidente qualquer alteram, até certo ponto, o curso dos acontecimentos. O Medo e a recompensa podem levar à substituição de um dado padrão de pensamento por um outro. Também o invento, a ambição, a crença acarretam diversas mudanças. Mas, tudo isto é tão insignificante quanto o movimento da superfície das águas. Não são fundamentais, profundas ou devastadoras aquelas transformações, pois a mudança, baseada em motivo, nada significa. A revolução sócio-económica é uma reacção e, como tal, nada tem de radical; consiste apenas numa troca de padrões. Esta mudança é mero ajustamento, uma acção mecânica, gerada pelo desejo de conforto, segurança, sobrevivência física.

Que produz a verdadeira mutação? O tempo e o espaço são o limite da consciência, do mecanismo do pensamento, do sentimento e da experiência. É um todo indivisível; por necessidade de comunicação, adoptamos a subdivisão da consciência em consciente e inconsciente, mas isso não é real. Ao nível superficial da consciência ocorrem mudanças, ajustamentos, reformas, acumulação de conhecimentos e técnicas; são superficiais e efémeras as mudanças que visam apenas ao ajustamento a uma nova ordem sócio-económica. O inconsciente aflora em sonhos, revelando as suas obsessões, exigências e íntimos desejos. Disso surge a necessidade de se interpretarem os sonhos, mas o intérprete é uma entidade condicionada. O estado de observação, livre da escolha e dualismo, é capaz de compreender instantaneamente qualquer movimento do pensamento e sentimento; torna-se desnecessário sonhar e o sono passa a ter um significado totalmente diverso. O observador e a coisa observada, o censor e o objecto da crítica, fazem parte da análise, da face oculta do consciente. Da análise nascem o conflito e o observador, esta entidade condicionada que interpreta e avalia os acontecimentos de maneira falsa e distorcida. Ainda que responsáveis por mudanças e ajustamentos superficiais da consciência, a auto-análise e a psicanálise são incapazes de provocar a sua radical transformação, ou a sua mutação.

Krishnamurti, Diário de Krishnamurti

Autoria e outros dados (tags, etc)




Arquivo

  1. 2022
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2021
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2020
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2019
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2018
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2017
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2016
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2015
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2014
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D

Mais sobre mim

foto do autor