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O requinte nada tem em comum com a sensibilidade: enquanto esta revela um estado de integração, aquele equivale a um fragmento. A sensibilidade é uma só: ou exprime a totalidade do nosso ser, de um estado de consciência plena, ou simplesmente não existe. Inútil é o seu cultivo lento e paciente ao longo dos anos, pois ela não resulta da experiência ou do pensamento; tão-pouco é a expressão de um estado emocional. Sem os excessos do romantismo e da fantasia, ela tem a qualidade do equilíbrio e da precisão. Somente os sensíveis podem encarar o real sem se enredarem em conclusões, opiniões e interpretações. Somente eles podem permanecer sós com a acção demolidora da solidão. Ao cessar de buscar o prazer, o ente sensível atinge a austeridade da compreensão e da lucidez. O prazer faz parte do requinte e este depende da educação, da cultura e do ambiente. Não há fim para o processo do refinamento; por resultar da escolha, do conflito e do sofrimento, existe sempre aquele que selecciona, a entidade que busca requintar-se, o ser que discrimina e exclui, nascendo daí a eterna dor. O refinamento leva ao isolamento, à indiferença e à fragmentação, frutos da actividade intelectual. Ainda que tenha elevado valor estético e moral, o requinte decorre do egocentrismo. Fútil e superficial, ele pode ser motivo de prazer e satisfação, mas falta-lhe a genuína alegria e profundidade. De facto, sensibilidade e refinamento em nada se assemelham; enquanto este conduz à morte pelo isolamento, aquela é a dádiva da vida plena.
Krishnamurti, Diário de Krishnamurti