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Ao atravessarmos a ponte, no meio do bosque banhado pelo sol, a meditação adquiria um novo significado. Um silêncio espontâneo vinha da ausência de desejo, busca ou lamentos do cérebro; os passarinhos cantavam, os esquilos subiam correndo pelas árvores, a brisa agitava as folhas e o silêncio existia. O pequeno córrego, que vinha de longe, transbordava de alegria, sem abandonar o seu profundo silêncio interior. Infinita e ilimitada imobilidade, que brotava da mente total. Não se tratava de um silêncio produzido pelo pensamento limitado e estreito, e, portanto, aceite como tal. Silêncio que não era fruto da experiência, para ser reconhecido e acumulado, pois não tinha fronteiras nem controle. Poderia desaparecer para nunca mais ressurgir, mas, ainda que reaparecesse, seria sempre diferente. O silêncio é sempre novo; o cérebro é capaz de repetir o passado, através da memória e da recordação, mas o passado não faz parte do presente. A meditação é a ausência da consciência, resultado do tempo e do espaço. O pensamento, cerne da consciência, não pode de maneira nenhuma provocar este silêncio; deve ser espontâneo o findar do intrincado e subtil mecanismo cerebral, sem depender de nenhuma recompensa ou garantia. É a única maneira de o cérebro permanecer sensível, vital e sereno. Faz parte da meditação a compreensão, pelo cérebro, das suas actividades superficiais e ocultas; nisto consiste a base da meditação, sem o que se torna uma actividade vazia de significado, conducente à auto-ilusão e à auto-hipnose. O silêncio é essencial para que ocorra a explosão da criação.
A maturidade não vem com o tempo nem com a idade. Não existe um intervalo entre o presente e o amadurecimento; esse intervalo não existe mesmo. A maturidade é aquele estado no qual cessou toda a forma de escolha; só os imaturos escolhem e conhecem o conflito nascido da escolha. Na maturidade não existe uma direcção qualquer, mas, sim, aquela que não vem da escolha. Qualquer espécie de conflito revela imaturidade. Não existe o amadurecimento psicológico, a não ser o inevitável processo orgânico de crescimento. Maturidade é a compreensão, que transcende todo e qualquer conflito. Por mais complexo ou subtil que possa parecer o conflito, tanto interior como exterior, ele é passível de compreensão. O conflito, a frustração e o preenchimento formam um só movimento, tanto interior quanto exterior. É como a maré que vai e vem, mas que em si mesma é apenas um movimento. O conflito deve ser compreendido na sua inteireza, não apenas intelectualmente, mas no contacto vivo e real com a sua essência. Esse contacto emocional e directo com o conflito, a crise, deixa de ocorrer se nos limitarmos a aceitá-lo, intelectualmente, como necessário, ou a negá-lo de forma sentimental. A aceitação ou a rejeição não alteram o facto e nem mesmo o raciocínio será capaz de provocar a crise necessária. Isso só vem com a percepção do facto. Esta percepção não ocorre se houver condenação, justificação ou identificação com o facto. Ela só se torna possível quando o cérebro cessa a sua actividade, limitando-se a observar, abstendo-se do acto de classificar, julgar ou avaliar. Existirá, necessariamente, o conflito enquanto houver a ânsia de preenchimento, com a sua inevitável série de frustrações; existirá o conflito enquanto existir a ambição, com o seu velado e implacável espírito de competição; e a inveja faz parte desse interminável conflito, gerado pelo desejo de vir-a-ser, de obter ou de alcançar o bom êxito.
A compreensão independe do tempo. A compreensão está sempre no presente, nunca no amanhã; é agora ou nunca; o que existe é o presente. O “ver” (perceber) é instantâneo; cessando no cérebro o conceito do acto de “ver” e compreender, ele é imediato. Esse “ver” é explosivo, isento de cálculo ou raciocínio. Na maioria das vezes, é o medo que impede a compreensão. O medo, com as suas defesas e sua coragem, é a origem do conflito. O “ver” não apenas vem do cérebro, mas também o transcende. A percepção do facto cria a sua própria acção, completamente diferente da acção baseada na ideia ou no pensamento; a acção emanada da ideia ou do pensamento gera conflito; a acção que visa ajustar-se à ideia, ao modelo, gera conflito. No campo do pensamento, todo o conflito é interminável.
Krishnamurti, Diário de Krishnamurti