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Ver com o pensamento e ver sem o pensamento são duas coisas distintas. Ao contemplarmos, com o pensamento, aquelas árvores ao longo da estrada e os edifícios do lado oposto aos campos assolados pela seca, o cérebro permanecia acorrentado ao tempo, à experiência e à memória. Neste processo, a incessante actividade do pensamento embota o cérebro, tornando-o incapaz de se renovar. A sua acção mostra-se inadequada e repetitiva por força do eterno mecanismo de reacção ao desafio. O acto de ver com o pensar mantém o cérebro prisioneiro do hábito e do reconhecimento. Dominado pelo cansaço e pela apatia, ele passa a actuar nos estreitos limites da sua própria criação. O cérebro atinge a liberdade quando o pensamento está ausente, o que não significa desequilíbrio ou loucura. Ausente o pensamento, resta apenas o estado de pura observação, livre do processo mecânico de reconhecer e comparar, justificar e condenar. Esse modo de ver desconhece a fadiga, pois destrói os processos mecânicos do pensar condicionado pelo tempo. O repouso absoluto renova a mente, torna-a apta a responder ao desafio sem reagir, a viver sem deteriorar, a morrer livre da tortura dos problemas. Ver sem o pensamento é ver sem a interferência do tempo, do conhecimento e do conflito. A liberdade de ver está fora do âmbito
da reacção, sempre presa a um motivo. A indiferença, o alheamento ou o desinteresse não resultam da observação livre de reacção. Ver sem o mecanismo do pensamento é ver sem restrições, de maneira imparcial, livre de qualquer barreira, porém apto a distinguir entre os diversos elementos que compõem o mundo em que vivemos. Existe uma diferença entre uma árvore e uma casa. Ver sem o pensamento não significa um cérebro adormecido. Ao contrário, é justamente quando ele está completamente despertado, atento, livre de atrito e dor. A meditação brota do estado de atenção, sem os limites temporais.
Krishnamurti, Diário de Krishnamurti